quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Como é que o jornal “The Australian” serve os interesses australianos em relação a Timor?

Austrália e a sua real-politik veiculada pelos média

Os media australianos voltaram novamente a carga sobre Timor-leste. Se durante a crise politico-militar em 2006 eles tomaram uma posição muito nacionalista, a favor dos interesses australianos – mudança de regime -, parece que desta vez esta posição não se alterou, independentemente do governo que está no poder em Timor. Isto é, no que toca aos seus interesses nacionais, a Austrália pode sempre contar com o apoio dos seus media para atingir os objectivos.

O jornal The Australian, na sua versão electrónica, divulgou no dia 13 de Agosto de 2008 uma notícia que questionou a morte do líder rebelde Alfredo Reinado juntamente com o seu elemento Leopoldino Exposto. Esta notícia rapidamente se replicou por outros principais medias australianos como The Age, Sidney Morning Herald e ABC. Segundo The Australian, Major Reinado e Tenente Leopoldino levaram tiros a partir de curta distância, ou seja, os dois morreram não por causa da troca de tiros com os guardas presidenciais mas sim, foram executados. The Australian adiantou ainda que o relatório da autopsia de Reinado e Leopoldino ao qual eles tiveram acesso evidenciou claramente esta hipótese. O que é estranho é que esse mesmo relatório que The Australian referiu, segundo o Procurador Geral da RDTL, Dr. Longinhos Monteiro, ainda não está pronto para ser publicado, mesmo assim o jornal australiano precipitou-se em avançar já com esta história de possível execução das duas vítimas. Perante esta situação, será que The Australian está fazer um trabalho puramente jornalístico ou continua naquela onda nacionalista de apoio aos interesses nacionais do seu país?

Quanto ao timing do lançamento desta notícia, esta veio na sequência da posição tomada por parte da segunda maior empresa petrolífera da Austrália, Woodside Petroleum, que no final do mês passado anunciou a possibilidade de pôr de lado a hipótese de ligar o gasoduto de Greater Sunrise para Timor-leste, argumentando que “esta ligação é demasiada cara e arriscada porque conta com uma distância de 184 km e tenha que atravessar uma zona muito profunda com cerca de 3 km de distância”. Um anúncio que recebeu logo o apoio implícito do governo australiano o qual falou que “no que toca às vantagens comerciais cabe às empresas decidir porque percebem melhor o assunto”. Em termos de distância, uma possível ligação para Darwin, Austrália, seria muito mais longa pois é de 450 km enquanto para Timor conta apenas com 184 km. Mas, afinal, o que é que isso tem que ver com os media australianos e a notícia sobre a morte do Reinado?

Os media australianos, através do The Australian, servem como uma arma por parte da Austrália e das empresas petrolíferas para atingir os seus objectivos que são ligar o gasoduto de Greater Sunrise para Darwin. Do lado timorense, o governo já contratou uma empresa coreana para estudar a viabilidade de ligação do gasoduto para Timor que ainda está por concluir. Se este estudo provar o contrário daquilo que o Woodside Petroleum apresenta, Timor Leste terá maior margem de manobra na negociação da construção do gasoduto. Para prevenir este cenário, The Australian lançou um notícia que tem um impacto potencialmente destabilizador, principalmente para um estado que acabou de sair dum conflito étnico e político-militar como Timor-leste.

The Australian procura com a sua notícia levantar mais dúvidas e confusões sobre a morte do Major Alfredo Reinado que durante a crise de 2006 se auto designou como o líder dos rebeldes e dos peticionários. Este major rebelde conquistou muito apoio e simpatia de muitos timorenses da parte ocidental da ilha que o viram como a personificação de alguém que consegue recuperar o seu orgulho perante as ditas “discriminações étnicas” , para além disso muitos ainda não se sentem convencidos com a forma como ele morreu. Deste modo, uma notícia que vem questionar novamente as circunstâncias da sua morte pode provocar uma nova onda de violência que coloca novamente em causa a segurança e a estabilidade do país. Perante uma instabilidade e falta de segurança, não há justificação para ligar o gasoduto para o solo timorense, uma vez que as empresas petrolíferas podem, simplesmente, argumentar que um ambiente assim pode colocar em perigo os seus investimentos. Deste modo, a missão está cumprida! O gasoduto de Greater Sunrise segue o caminho do Oleoduto de Bayu Undan para Darwin e o plano australiano de revitalizar e industrializar os seus territórios do norte pode seguir em frente enquanto o plano timorense de desenvolver a zona sul do país fica adiado para um tempo indeterminado. Para lidar com uma provocação destas é importante que os timorenses, desde os políticos até aos cidadãos normais, se mantenham calmos e não se deixem facilmente levar pela onda que pode atirar o país de novo ao abismo.

O que é certo é que do lado australiano, as suas políticas em relação a Timor desde os anos da II Guerra Mundial até aos dias de hoje assentam sempre na real-politik, é indiferente de quem está no poder seja um governo de conservadores ou de trabalhistas. Cada passo que é dado reflecte sempre os seus interesses mesmo que isso seja à custa do sofrimento dos outros e recorrendo a qualquer meio para salvar esses interesses, tanto meios militares, como em 2006, bem como meios de comunicação social, como recentemente se verifica com o jornal The Australian e muitos outros. Tendo em conta a proximidade geográfica e o poder relativo que este nosso vizinho possui ao nível mundial mas sobretudo ao nível regional, é necessário conduzir bem as nossas políticas de maneira que não choquem cegamente com as suas e ao mesmo tempo garantir uma política externa mais independente para salvaguardar os nossos interesses, o que com certeza não é fácil de pôr prática mas temos que aprender viver com isso.
Por Olivio Deus